«Pega no telefone e liga-lhe, não tens nada a perder. Diz-lhe que tens saudades dele, que ninguém te faz tão feliz, que os teus dias são secos, frios e áridos, como um deserto imenso, sem oásis nem miragens, sempre que não estão juntos. Pega no telefone e liga-lhe. Se ele não atender, deixa-lhe uma mensagem. Ou então escreve-lhe um sms a dizer que queres estar com ele. Não te alongues nem elabores, os homens nunca percebem o que queres deixar cair nas entrelinhas. Tens de ser clara, directa e incisiva. E não podes ter medo, porque o medo é o maior inimigo do amor. Cada vez que deixares o medo entrar-te nas tuas veias, ele vai gelar-te o sangue e paralisar-te os nervos, ficas transformada numa estátua de sal e morres por dentro. A vida é uma incógnita, hoje estás aqui, amanhã podes ficar doente, ou cair-te um piano em cima quando fores a andar na rua. Ainda há pessoas que atiram pianos pela janela, sabias? Nunca se sabe como será o dia de amanhã, por isso não percas tempo e pega no telefone e liga-lhe. Tenho a certeza que ele te vai ouvir, tenho a certeza que ele te vai ajudar, tenho a certeza que ele, à sua maneira - e é tão estranha a forma como os homens gostam de nós - ainda gosta de ti. Mesmo que já não te ame, ainda gosta de ti, como tu vais aprender a gostar dele, quando a vida te obrigar a desistir deste amor. Ele está longe, mas olha para ti por entre memórias, presentes e flores. À noite, entre sonhos alterados pelo álcool e as drogas leves, tu apareces-lhe na cama e ele volta a sentir o cheiro da tua pele e volta a amar-te com todas as suas forças. Ainda que não acredites, tu viverás para sempre nele, tal como ele vive em ti, na memória das tua células, num passado que pode ser o teu escudo, mesmo que não seja o teu futuro. Pega no telefone e liga-lhe. Fala com ele de coração aberto (...) Mas não fiques quieta, à espera que a vida te traga respostas. A vida é tua, tens de ser tu a vivê-la, não podes deixar que ela passe por ti, tu é que passas por ela.»
domingo, 14 de junho de 2009
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«Se calhar não sabes como é que se faz tricô, por isso vou-te explicar. Vais a uma loja de lãs - há muitas em centros comerciais de bairro - escolhes a cor ou as cores que mais te agradam, a grossura da lã consoante o tipo de camisola que queres fazer e as agulhas apropriadas a essa grossura. As agulhas estão divididas em números e meios números e podem ser de metal ou de plástico. Compras a lã ao quilo, em meadas, ou em novelo, se alguém já tiver dobado a meada por ti. Senão, chegas a casa e pedes a alguém que estenda os braços para dobares a lã, ou então utilizas as costas de uma cadeira, à falta de um ajudante mais prestável. Dobar a lã, isto é, transformar a meada em novelo tem os seus segredos: deves começar por enrolar o fio à volta dos 4 dedos e depois continuar sempre com os dedos entre o que já está dobado e o que está a dobar, para o fio não ficar apertado e não se estragar. E ter paciência para desfazer os inevitáveis nós que te vão aparecer. Se trabalhares bem, quando a meada acabar tens um ou dois novelos de lã muito fofos, daqueles que fazem as delícias dos gatos e então podes começar a trabalhar.
Como muitas vezes acontece na vida, o princípio é o mais difícil; tens que enfiar as malhas na agulha, uma a uma, usando o polegar e o indicador num bailado que cruza o fio de modo a ficar enlaçado na agulha sem prender. A isto chama-se fazer laçadas. E depois de quarenta ou cinquenta laçadas, quando achares que já tem a largura que pretendes, rematas a última, viras a agulha para o outro lado e recomeças. É difícil, requer paciência e visão. Paciência porque é feito malha a malha, visão porque tens que conseguir imaginar a tua camisola ou o teu cachecol já prontos e é isso que te vai dar alento para continuares durante serões a fio a tecer aquele sonho.
Claro que, pelo caminho, podem acontecer vários azares: as malhas podem ficar muito apertadas, ser a mais ou a menos porque calculaste mal a largura, a agulha pode revelar-se muito fina ou demasiado grossa para aquele tipo de lã e o mais normal é cair uma malha sem dares por isso e teres que desmanchar tudo até à laçada em que a malha se escapou. Mas a pouco e pouco a camisola vai crescendo, vai ganhando forma e o seu pequeno manto aquece-te o regaço e as pernas.
O trabalho repetido e minucioso afugenta-te os fantasmas e dá-te asas, porque não tens que pensar em nada. É uma forma de libertação ou de alienação, chama-lhe o que quiseres. Eu comecei na loucura do tricô quando tinha 16 anos e me diagnosticaram uma possível leucemia. Os leucócitos no sangue multiplicavam-se todas as semanas e os médicos demoraram muito tempo a perceber que afinal o que eu tinha era mononucleose, mas nessa eu já estava a acabar uma camisola, tal era o medo de morrer. Era azul e branca às riscas, teria feito as delícias do Pinto da Costa.
Tudo isto para te dizer minha querida, que quando te vi outro dia, qual Fénix recuperada por esse amor sério, pensado e amadurecido pelo conhecimento profundo e honesto que só a amizade pode dar, que te achei feita de tricô, a ti e ao teu cavaleiro negro, as mãos entrelaçadas como fios e o olhar preso num calor que não se explica, que me senti enchi de alegria por ti e me apeteceu explicar-te porque é que te vi assim, feita de um mesmo fio trabalhado com minúcia e tempo pelo amor.
Não sei durante quanto tempo essa camisola te vai aconchegar o coração nem quantas malhas vais perder pelo caminho, nem quantas terás que matar para fazer as cavas ou os decotes, mas quero que saibas que a lã, depois de tecida, já não é só lã, ganha vida própria e quem sabe, não terás encontrado o manto abençoado que te aquecerá as noites para o resto da vida, protegendo-te para sempre dos males do mundo como uma segunda pele.»
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